Necessidade absoluta

Por E.Luighi

Olá pessoal! Comumente ouço aqui na oficina, as seguintes frases. “Eu só queria abaixar um pouco as cordas,… o resto tá bom.” ou, “Meu professor disse que é só prá dá uma abaixadinha nas cordas, que estão meio altas”. ou ainda, “Regular não precisa não, é só dá uma abaixada nas cordas que tão altas”. Com raras exceções, abaixar a ação de cordas é um dos processos de ajustes mais trabalhosos, pois, “Ação baixa de cordas” é resultado de vários outros ajustes.

Ajustar Ângulo do braço em relação ao corpo, equilibrar a concavidade ou convexidade da escala através do tensor, e ajustar a altura das cordas no capotraste e na ponte, são as operações necessárias para obter a ação de cordas desejada. Entretanto, se os trastes não estiverem perfeitamente alinhados entre si, os procedimentos acima não têm efeito algum. Trastes, mesmo em instrumentos novos, podem não estarem suficientemente alinhados para uma ação de cordas baixas. Isso porque, quando o instrumento é fabricado, dependendo, do seu valor, ou da categoria em que se encaixa, às vezes não esta previsto um ajuste minucioso, pois se assim for operado tal ajuste, o custo do instrumento cresce em demasia, pois é expressivo o custo da mão de obra especializada, e desta forma o instrumento avança uma categoria e o preço evidentemente sobe também.

Comumente instrumentos mais caros, e claro que também de melhor qualidade, costumam sair da fabrica melhores preparados para oferecer ao consumidor mais exigente, possibilidades de ajustes mais simples e menos onerosos. Entretanto, é preciso pensar em uma linha de tempo e trajeto que não fica claro ao consumidor.

Suponhamos que em janeiro de 2010 na china um instrumento X de boa qualidade é fabricado. O mesmo é ajustado e depois vai para estoque esperar para ser despachado ao seu destino. Isso pode acontecer de um mês a um ano depois. Mas, digamos que esse no caso levou apenas 60 dias. Então partiu em março rumo ao Brasil. Se for de avião estará na alfândega em no máximo dois dias. Evidentemente o desembaraçar legal das importações costumam levar de uma semana a 30 dias. (quando não levam meses). Bem, se viajou de navio, para baratear o frete, aí a coisa muda,.. já são meses. Mas vamos imaginar que esse veio de avião e desembaraçou em duas semanas.

Então já estamos na metade de março. De posse dos instrumentos, os mesmo vão para o depósito do importador, aguardar que as lojas comprem a mercadoria. Isso pode levar de um mês a um ano. (Há casos que até dois anos). Porém vamos dizer que nosso instrumento X levou dois meses. A loja que o comprou vai esperar que um cliente o compre. Isso pode levar,…Sabe Deus quanto tempo. Até anos,…Mas nosso instrumento X é sortudo então vendeu em 4 meses. Então faça as contas. Foi para as mãos do cliente fim de setembro a começo de outubro. (Isso é uma hipótese bem otimista.) – Ou seja, o instrumento já tem nove meses de idade. E foi chacoalhado. Enfrentou mudanças de temperatura. Isso não não estava exposto na loja. Querer que o ajuste do setup esteja perfeito. Seria quase um milagre. E acreditem!! É comum instrumentos ficarem por dois anos em um limbo até serem adquirido pelo cliente. Todo esse tempo, aliado as variações climáticas, faz o braço do instrumento “mexer”, (Côncavo e convexo) e desta forma os trastes podem desalinhar. Claro que estamos falando de medidas micrométricas. Contudo, essas medidas fazem a diferença para uma ação baixa de cordas. Solução?? Retifica de trastes, além de claro uma regulagem do instrumento. [PARA AMPLIAR CLIQUE NA FOTO]

A retífica de trastes é uma operação que serve para alinhar perfeitamente os trastes entre si. Ou seja, para que o traste posterior não seja mais alto que seu antecessor. Claro que quanto mais baixo se quer as cordas mais preciso precisa ser essa operação. Mas a retifica tem uma função mais importante, que é corrigir trastes amassados, e riscados, pelo uso do instrumento. Trastes nesse estado geram trastejamento, e desconforto, e se não forem retificados logo, às vezes só a substituição é a solução. Isso porque às vezes suas fissuras são tão fundas que mesmo que retificados, os trastes se tornam tão baixos que tocabilidade fica muito afetada.

O ideal é que ao primeiro sinal de amassado ou fissura procure um Luthier para retificar os trastes. ”Alguém” fez alguns testes e chegou a conclusão que dependendo da força empregada leva se de 6 a 8 horas para começar a marcar os trastes. Como não se toca 8 horas sempre sobre um mesmo traste, isso em tempo médio é aproximadamente 3 meses. Claro que essa “pequena marca” não gera problemas, contudo para que esse tamanho se dobre não são mais 3 meses, e sim 45 dias, pois é uma progressão.A partir da primeira pequena marca, a corda sempre atinge aquele lugar, pois vira uma espécie de trilha. Desta forma, eu costumo aconselhar que regule seu instrumento em media 1 vez ao ano, ou ao menos leve ao Luthier para que ele avalie se há ou não a necessidade de retifica dos trastes.

Em minha opinião trastes marcados como os da foto são o limite máximo para retífica. Mais marcados do que isso só troca dos mesmos. Já nessas condições indico a troca. Volto dizer. É possível retificar, porém a altura ficaria inadequada ao uso.

O processo de retífica resume se em alinhar os trastes ou como uma lima específica para o uso dessa operação, ou com uma pedra de carburundum. (Prefiro a pedra). Posteriormente, com lixas 240, 600, 1200, respectivamente, retiram-se os riscos deixados pelo processo anterior. Em seguida com limas também específicas para esse trabalho, estreita – se a largura dos trastes, para primeiramente, deixar sua superfície homogênea, e depois que trastes largos podem causar trastejamento sobre seu próprio corpo, e tornar o instrumento “duro” uma vez que se aumentou a área de atrito das cordas. Logo após, as laterais dos trastes devem ser limadas para que houver pontas ou rebarbas, não causem problemas nas mãos do instrumentista. Depois novamente a seqüência de lixas é utilizada, e após limpa a escala, o uso de uma palha de aço fina se faz necessário para promover um polimento. Nesse caso como a escala é escura (Rosewood ou Pau ferro, entre outras), se limpa com álcool isopropílico para também abrir os poros da madeira para que a mesma possa receber um produto chamado óleo de limão, que além de limpar, hidrata a escala.

Então chegou o momento de colocar as cordas e regular o instrumento. “Como podem perceber ‘Dar uma abaixadinha nas cordas” é algo muito mais difícil que parece. Esse processo serve tanto para guitarras, violões, ou contrabaixos. Contudo para instrumentos com escala clara, se faz necessário isolar a escala para não arranha-lá.      

No meu livro Guia Ilustrado da Guitarra Volume I (Manual de conhecimentos e reparos essencias) vocês encontrarão mais detalhes tanto da retífica de trastes como de todo processo de regulagem. Até a próxima pessoal!!